Tomei mais um gole do chá e pus a xícara em cima da mesinha de madeira cor de marfim à minha frente. Silêncio. Um silencio que ao meu ver parecia um tanto quanto eterno. Senti que era minha vez de falar alguma coisa. Eu apenas não sabia exatamente o quê dizer, nem ao menos o quê deveria ser dito. Respirei fundo, contei mentalmente até dez.
- Você me disse isso há cinco meses e um dia depois me deixou. - disse, por fim. - Acha que eu deveria acreditar dessa vez?
- Sinceramente, acho que não. Se você fosse uma menina esperta não me deixaria nem ao menos entrar para beber chá com biscoitos. - disse ele rindo. - Mas você me ama, e eu sei disso. E você ao mesmo tempo consegue ver que eu ainda te amo apesar de tudo o que aconteceu. E você sabe que é verdade. Mas você não quer acreditar, não é? Acha que vou te deixar de novo se tentarmos pela segunda vez...
- É bem provável. - disse duramente.
- Sei que errei e estou disposto a recomeçar. Não de continuar de onde paramos. Temos que refazer nossa história. - ele sorriu.
Não falei mais nada. Nem ele. Nenhum de nós. Bebi mais um pouco do chá e comi um biscoito. Ele imitou.
- Como vai o jardim?
- Está ótimo. Plantei mais algumas coisas... - disse servindo mais um pouco de chá na xícara dele.
- Obrigado. - disse ele se referindo ao chá. - Posso ver?
- Não há de quê. Sim, claro. Venha. - disse, me levantando.
Caminhamos para fora e nos dirigimos até o jardim que ficara atrás da casa. Algumas coisas mudaram desde que ele se fora há alguns meses. Me encarreguei de mudar a cor das rosas, agora não vermelhas e sim, troquei-as por brancas.
- Rosas brancas... Bonitas. - ele elogiou.
- Obrigada. - sorri dizendo.
- E onde foram parar as vermelhas? Eram as suas preferidas... - perguntou ele, curioso.
- Joguei fora. - dei de ombros e continuamos caminhando pelo jardim.
- Mas porquê? Nossa, você gostava tanto delas...
- Assim como gostava de tantas outras coisas antigamente, mas tive que deixá-las para trás. O tempo passa e algumas coisas, não todas, mas apenas as mais frágeis envelhecem.
- O que está escondendo?
- Nada. São apenas flores.
- Flores mortas?
- Flores... Apenas flores.
Andamos mais alguns passos, outras flores, de vários tipos passavam e nós não percebíamos.
- Foi difícil ter que te deixar... Eu ainda te amava. - ele continuou.
- Você não tinha. Mas você fez.
- Eu... Eu fui estúpido. - lamentou-se
Sentamos num banquinho branco de parque que tinha no meio do jardim. Sem perceber, a escuridão da noite estava tomando conta do crepúsculo que nos rodeava enquanto continuávamos conversando sobre nossas vidas.
- Como vai as suas garotas? - falei rindo.
- Sinceramente, só tenho uma garota e ela está bem na minha frente. E para ser mais sincero ainda, você sabe que desde que nos conhecemos, eu melhorei e muito.
- Tem ido à igreja? - perguntei aleatoriamente.
- Tenho. Duas vezes por semana e às vezes até quatro! - disse rindo num tom de espanto consigo mesmo.
- Fico feliz. É o melhor que você faz. - sorri.
- Estou tentando melhorar. E você também vai às vezes. Por que não vai com mais frequência?
- Na verdade, estou indo em outra igreja agora. De vez em quando apareço lá, você sabe, é difícil por que eu nasci e cresci lá.
- Não deveria ter saído.
- Não saí.
- Então por que não vai mais?
- Estou tentando me estabilizar novamente.
- Está sendo difícil?
- Não mais.
Nos calamos e observamos as estrelas por um momento. A noite chegara e o frio também. Ele tirou o casaco e jogou por cima de mim e me puxou para entre seus braços, me colocando bem junto de seu peito.
- Não precisava.
- Claro que sim. - sorriu. Sorri de volta. O céu estara limpo e repleto de estrelas.
- Quais as suas preferidas? - disse ele apontando para o céu.
- Acho que aquelas duas ali. - apontei para duas estrelas que estavam ao norte, sobre nossas cabeças.
- Acha que elas significam algo? - disse acompanhando com os olhos.
- Não. Apenas estrelas.
- Você se tornou tão simples assim? Não há mais filosofias subliminares nas coisas? Tudo se tornou apenas?
- Sim. Apenas flores, apenas estrelas, apenas amor, apenas nós dois. Sabe, desde que você se foi, sinto que nada faz sentido. - me entreguei.
- Por que não faz?
- Porque você dava tom de vermelho aos dias cinzas.
Nos encaramos por exatos quatro segundos. O que iria acontecer? Talvez as coisas mudassem, talvez a gente continuaria seguindo em frente para não nos machucar. Talvez tudo continuaria sendo como nos últimos meses... Simplesmente apenas.
E depois, parando todos os meus pensamentos tortos, ele me beijou.
Fim.
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